2 de agosto de 2010

A vidraça


Sinto até hoje a falta de alguma coisa. Qualquer coisa que não sei o que é. Já senti melhor o vento, já fui mais atenta com os livros, já tive uma letra mais bonita, já tive mais tempo para os amigos, já fui menos chata com a comida, já tomei refrigerante sem preocupação, já andei muito de pés descalços, já corri mais do que meu fôlego. E viver não me matou. Hoje me tornei tão cuidadosa a ponto de ser chata, a ponto de colocar cautela na frente da emoção. Hoje tudo tem que ser planejado. Hoje nem pensar em andar descalça ou tirar alguns minutos para me preocupar com raios de sol. Meu jardim é mais do jardineiro do que meu, meu jardim me vê por trás das vidraças todas as manhãs. A vidraça impede de nos tocarmos. A vidraça é a barreira intransponível entre meu relógio e o cheiro da grama amanhecida. Sinto falta do meu jardim. Sinto falta de quem eu era quando estava no meu jardim.

Cáh Morandi


Em 02/08/2010

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